Deus estava distraído quando criou o homem


|Por Ricarlos Castro|


Eu vim apressado da biblioteca para casa ver o embate ibérico, Espanha e Portugal, na copa do mundo. O cronômetro ia pelos 15 min., me acomodei em frente ao televisor, e me distraí um pouco com umas lantejoulinhas que ficaram cruzando o pensamento. Ia vendo o jogo fragmentado, aos poucos, distraído. Já no segundo tempo, virei a cabeça preguiçosamente: vejo os espanhóis tocando a bola na frente da área portuguesa, e o quê? O gol — o único da partida. Eu tinha grudado os olhos meio que por acaso no televisor, e, por isso, devo à casualidade uma iluminação que tive.

Lá digo: — O gol é um lance individual. De modo que persiste no imaginário. Outros, se perdem. Eu, que via ao jogo meio distraído, descobri a verdadeira culpa de meu estado divagativo. Olhei agradecido para as bandeiras, a espanhola e a portuguesa, pela partida morosa. Devo a ela uma compreensão metafísica do futebol.

Há lances individuais e outros indistintos. O gol; e há outros lances também individuais, como o drible, falta, a defesa. E por aí vai. Os lances indistintos são todos os que sobram, que não são lembrados. Eles constam a maioria de um jogo ruim. Conheço comentaristas futebolísticos, dentre os mais exaltados mas também dos mais comedidos, que acham os lances indistintos indignos do futebol. Os mais messiânicos vêm na proliferação deste tipo inferior de futebol o sinal do fim do futebol arte.

Ricarlos Castro (28) é estagiário de auxiliar técnico administrativo na UEFS.

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