Robinho sob a égide do prazer




Sempre achei Robinho um jogador espetacular. O que lhe critico é o jeito como lida com a carreira e esta obsessão tola de provar aos outros e a si que pode ser o melhor do mundo. Até o mais abnegado por futebol sabe que a escolha do melhor jogador FIFA não é apenas técnica. É sobretudo política, marqueteira e subserviente à Champions League. Ou será que ninguém parou pra pensar por que todos os jogadores premiados até hoje atuaram em campos europeus? É evidente que os motivos deste prêmio vão muito além do trato com a bola.

Kaká, que tecnicamente não é lá tão melhor que Robinho, sabe como ninguém administrar sua carreira. Por isso (evidentemente não por isso) se mantêm há muito entre os melhores: joga em bons times, não se deixa levar pela primeira oferta milionária que lhe chega às mãos e, o mais importante, não é deslumbrado com a fama. Brinco com amigos que se trata de sua ética protestante. Ele sabe realmente lidar com o mundo dos negócios: exemplo disso foi sua ida para o neo-galático Real Madrid ao invés de se enveredar pelos petrodólares do Man City.

Robinho não é assim, é muito mais intempestivo, está sempre movido pela égide do prazer, e por isso comete algumas asneiras imperdoáveis: por que diabos saiu do Real Madrid quando dava mostras de que se firmaria no time? Ora, dinheiro, fama e bajulação: foi o que o Sheik lhe prometeu e, em boa medida, cumpriu. Robinho é que não deslanchou. Também como deslanchar em um time mediano, que sequer disputa o principal campeonato Europeu? Enquanto Kaká trocava passes com Seedorf, Pirlo, Ambrosini e Gattuso, e usava um dos mantos mais temidos do Velho Mundo, Robinho era a estrela única de um time de tradição meramente local, e olhe lá.


Mesmo sendo o atleta mais caro da história do Man City, o técnico, adepto ao rodízio de jogadores, não lhe garantia sempre entre os titulares. E nesta redoma de amargar alguns jogos na reserva, e quando solicitado não render metade do que dele se espera – aqui incluo suas últimas partidas pela Seleção - a imprensa e a opinião pública pediram sua ausência da Copa. A qual, aliás, sou bastante contrário. Porque ou montamos um grupo robusto, taticamente entrosado, onde o treinador saiba das características de seu elenco, ou comentemos o erro do imediatismo intransigente. Não sejamos tolos, Robinho está na lista de Dunga desde que este começou seu criticado trabalho na Seleção. E no momento de afirmação do técnico, que foi a última Copa América, Robinho foi o único entre as estrelas a garantir presença e a jogar muita bola – tanto que foi o artilheiro da competição. Não passa pela cabeça de Dunga deixar Robinho fora da Copa. Isto só acontecerá se alguma catástrofe indisciplinar ocorrer ou, obviamente, em caso de lesão.
Bom, mas se eu fosse Dunga, teria colocado Robinho no banco nos principais jogos da seleção nas eliminatórias e na Copa das Confederações. A imprensa, essa besta-fera, cairia de pau em cima de mim (Dunga). É claro que em futebol a lógica é altamente discutível, mas a saída de Robinho do time titular tanto daria a Nilmar a chance de ouro que ele estava merecendo, como faria Robinho ligar o sinal de alerta a respeito de sua vaga no time. O deixaria mais motivado, penso.
Dunga não sacou Robinho do time. Só que mesmo assim Nilmar aproveitou a pouca chance que teve nos últimos jogos das eliminatórias e agora tem boas chances de ir à Copa. Robinho, temerário que o mau momento o tire da lista, forçou a saída do Man City por empréstimo e veio se juntar à nova geração de talentos do Santos: Neymar, Paulo Henrique Ganso e André.
Ouvi dizer que essa sua volta não passa de um estratagema empresarial. Bom, claro que foi uma estratégia, isso não se discute. A grande diferença é que pela primeiríssima vez Robinho soube fazer disso algo benéfico tanto para si, quanto para o Santos, que começou a temporada como mero coadjuvante e hoje é apontado como um dos favoritos ao Estadual e à Copa do Brasil.

Quem assistiu o clássico contra o São Paulo no domingo passado sabe que o repentino favoritismo da equipe da Vila não vem da mera especulação. O Santos jogou muito bola, e o grandioso São Paulo passou boa parte do jogo esmagado no próprio campo, desnorteado com a troca de passes da meia-cancha santista encabeçada por Arouca e Paulo Henrique. Neymar não foi tão decisivo como vinha sendo nos jogos anteriores, também foi covardemente caçado pelo truculento Renato Silva o jogo inteiro. Mas mesmo assim protagonizou o pênalti mais bonito do ano. A paradinha desestabilizou tanto Ceni, que ele no intervalo procurou o garoto para destilar mais uma de suas inúmeras hipocrisias. Mandou o Neymar tomar cuidado porque na Europa não pode bater dessa forma, sendo que ele Ceni é usuário costumaz desse tipo de cobrança. Creio que o excelente Neymar tenha freqüentado aulas de geografia suficientes para saber que ainda pisa em terras brasileiras. “Porque ele vai mesmo para a Europa, então resolvi falar com ele”. Ceni deu a entender que não se deve tripudiar dos bravos profissionais que permanecem no Brasil, ganhando mau e jogando em gramados torpes. Neymar não lhe deu importância, claro. Perguntado, respondeu: “tem que ousar mesmo, tem que ser abusado”. Esse é o espírito do craque. O jogador medíocre diria que é preciso respeitar o adversário, que não fará novamente. Balela.
Robinho entrou quando o jogo estava empatado. Logo que participou, fez umas duas firulas que não resultaram em nada. A torcida delirou. Quando tabelou com Neymar, quase fez em duas oportunidades. Uma Ceni operou milagre.
Eu não esperava, ninguém esperava aquele gol de Letra. Mas ele aconteceu. Foi uma catarse coletiva. Soltei uma gargalhada tão alta que acordei minha tia que cochilava no outro quarto.



O gol de Letra foi o presente de boas vindas que os deuses do futebol deram à chegada de Robinho aos gramados brasileiros. Espero que ele saia dessa experiência de voltar ao útero que o gerou para se redescobrir e finalmente mostrar ao mundo que o futebol não é guerra, não é truculência: é, sobretudo, celeste e artístico.
Deixemos de não querer enxergar o óbvio: Robinho é craque. É um craque mimado e marrento, é verdade, mas, como disse o excelente Tostão, o grande equívoco no futebol está em optar pelo jogador médio, porque correto e disciplinado, ao invés de ajudar os craques problemáticos a serem mais profissionais.

7 comentários:

9 de fevereiro de 2010 às 09:08 Raíssa Caldas disse...

Se eu sou tricolor, a culpa é de Kaká.

9 de fevereiro de 2010 às 09:11 Raíssa Caldas disse...

Ahh, esse texto já é da Cãimbra? ahahhhaah

10 de fevereiro de 2010 às 06:32 Luciano Penelu disse...

Ótimo texto. Tenho alguns senões com relação ao futebol do pequeno Robens, mas de fato ele é craque.

10 de fevereiro de 2010 às 06:41 M. Correia disse...

Afinadíssimo, Ederval.

11 de fevereiro de 2010 às 14:37 Paulo Moraes disse...

Creio que esse irá enganar, pois é apenas um bonequinho da Globo para a Copa.

21 de fevereiro de 2010 às 11:25 Unknown disse...

Não sou lá um grande fâ do Robinho, mas sentia o mesmo pelo Romário por sua ligação com o Flamengo, sinto o mesmo por qualquer jogador que atua pelo Real ou Milan, que tolice. Craques indiscutíveis!!!!

23 de fevereiro de 2010 às 05:12 Daniel Pondé disse...

Excelente Texto!!! Muito bem escrito. É exatamente o que acho acerca de Robinho. Não tem como não levar para a Copa ( como também não tem como não levar Ronaldinho Gaucho, preterido na última convocação, que relacionou o "craque" kléberson em seu lugar).

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