Como se fosse a primeira vez ou os clubes cariocas na Bahia

|por Franklin Oliveira|
Gente, esta semana os baianos tiveram um grande consolo. Não é só a dupla BA-VI que tem que se preocupar com o rebaixamento, o próprio poderoso EUA foi rebaixado pela agência Standard & Poor. É que o futebol da economia é sério, não tem FIFA, CBF, tabela arranjada e nem juiz ladrão pra não deixar os clubes, digo países, grandes caírem. Vá lá que gente fina é outra coisa. Ao invés de Primeira e Segunda Divisão também chamam lá “Séries A e B”. E, diga-se de passagem, o rebaixamento não foi nem da A pra B. É que lá tem séries pra cachorro, e aí inventaram o rebaixamento da série AAA para a série AA+. Pô mas porque + e não -? Garanto-lhes que se fosse o Brasil pegava logo um BBB! E olhem que nem a cota da TV deles vai baixar!

Enquanto essas coisas acontecem o “democrático” governo britânico agora está censurando a internet e o celular. Quem diria que isso fosse acontecer na terra da Rainha Elizabeth? Agente pensava que isso só acontecia lá pras bandas da Líbia, da Síria, do Irã, do Afeganistão e outros países que costumam receber censuras da OTAN, do Conselho de Insegurança da ONU e de outros bichos por esses mal feitos. Quer dizer, não tem trocadilho certo. Além da repressão do governo Bashar (Assad) os manifestantes ainda tem que aguentar o governo inglês “baixar” o pau.

Mas mudando de um polo pra outro o que está me indignando mesmo é a nova pesquisa da loja Blockbuster que aponta quais os filmes preferidos para locação. Vocês sabem como funcionam agora as pesquisas de cinema. Nem perdem mais tempo telefonando pro pessoal, ficam nas lojas mesmo. E olhem que nem perdem tempo com a Blockbuster do Brasil ou da Bahia ficando lá mesmo pela loja nos EUA.

Mas, picuinhas à parte, o que não concordei mesmo foi com a classificação. Imaginem que o famoso Casablanca, que povoou a minha adolescência e fez suspirar os corações apaixonados, acabou ficando em segundo lugar, perdendo pra Como se fosse a primeira vez.  Aliás, foi o único de antigamente que teve vez, pois o terceiro lugar ficou com Harry e Sally – feitos um para o outro, o quarto para Penetras bom de bico (é demais!) e o quinto pra A princesa prometida.

Durma-se com um barulho desses e diga-se que dormiu! O campeão de locações é o dramalhão mais besta que se tem noticia. Fala sobre uma mulher que tem uma doença que a faz esquecer-se das coisas que se apaixona por um sedutor veterinário e vive uma história de amor que tem que se renovar a cada dia pra existir. Você conhece Drew Barrymore e Adam Sandler? Pois são os protagonistas do filme. Nada de Humphrey Bogart, Ingrid Bergman ou Marlon Brando. E o pior é que o roteiro é inteiramente copiado da Bahia. É claro que aqui não teve essa xaropada de doença rara onde só se esquece do que aconteceu no dia anterior, mas que a presença de alguns clubes visitantes mas pareceu com a primeira vez isso foi!

O primeiro clube carioca a jogar na Bahia foi o Botafogo, que veio aqui em fevereiro de 1919, quando nem se pulava direito o carnaval e sapecou sete a um na seleção baiana no campinho do Rio Vermelho. Os baianos ficaram com tanta raiva que só o trouxeram de novo 16 anos depois na conjuntura conturbada de 1935. Foi como se fosse a primeira vez. O time de General Severiano deu de sete no Vitória e de quatro no Bahia, só escapando o Botafogo (que empatou a quatro gols) e o Galícia, então demolidor de campeões, que o venceu por três a um. O negócio foi tão complicado que alguns dias depois estourou a revolução da Ação Nacional Libertadora que começou aqui perto, em Natal e em Recife. Sete anos depois os baianos insistiram em trazer o alvinegro carioca. Foi como se fosse a primeira vez. O desgraçado chegou em janeiro de 1942 se aproveitando da preocupação dos baianos com a guerra e foi “sentando o pau” no pessoal. Mas parecia o governo inglês escondendo que o bairro de Totenham Court (onde começaram os distúrbios) tem a maioria dos jovens desempregados. Começou dando de cinco no Botafogo, e q1uatro dias depois deu uma “colher de chá” empatando em quatro gols com o Vitória. Logo depois enfiou cinco no Galícia, e três no Bahia, conseguindo à custo o auri negro um empate em um gol. Aí então viajou pra Feira de Santana onde ganhou a seleção local por quatro a dois e finalmente cansou, perdendo pro tricolor por dois a um.

Mas isso não aconteceu apenas com o primeiro clube carioca que chegou na Bahia, ocorrendo também com o segundo, o América FC, mostrando que era uma desfeita de caso pensado. Esse apareceu por aqui em setembro de 1921 estreando o novo estádio da Graça construído no ano anterior.  Foi uma “desgraceira no caminho da feira”. Começou abatendo o Combinado Baiano de Tênis-Botafogo (4 X 2), e depois foi derrotando a Associação Atlética (4 X 3), o Ypiranga (3 X 0) e o Vitória (2 X 1), só parando, à muito custo, na seleção baiana, que conseguiu a façanha de empatar com os americanos em um gol. Depois vieram outros Américas mas nenhum igual ao original do Rio de Janeiro. Quanto ao original viria antes do carnaval de 1939, ano em que começou a guerra na Europa, mas não se sairia tão bem. Começou perdendo do Botafogo (1 x 2), e ganhou com dificuldade do Galícia (2 X 1), pra logo a seguir empatar com o Ypiranga (2 X 2) e tomar um “chocolate” do Bahia (4 X 1). O ameriquinha só voltaria à Bahia nove anos depois, pra vencer o Galícia (6 X 5), arrasar o Ypiranga (6 X 2) e perder na saída pro tricolor (1 X 2). Quase que era como a primeira vez, mas o time havia esquecido o que aconteceu como a mulher do filme.

Só não aconteceu o mesmo com o terceiro carioca que nos visitou, o Vila Isabel (que diabo é isso?), porque este nunca mais voltou. Mas a mesma coisa sucedeu com o quarto e o quinto visitante daquele estado, o Fluminense e o São Cristóvão. O pós de arroz chegou em 1923 e o time do padroeiro quatro anos depois. Este último, depois de vencer o mais querido por dois a um, passou o fação no Vitória (4 X 1) e Botafogo (3 X 1), embora se tenha salvo o Baiano de Tênis, que conseguiu um heroico empate a três gols.Tiveram que organizar às pressas um combinado baiano...só pra apanhar de três a zero pro time do padroeiro dos motoristas.

Os próximos anos foram muito humilhantes para os baianos que só ficavam lendo pelos jornais o time do santo apanhar de deus e o mundo no campeonato carioca. Aí decidiram chama-lo outra vez pra ver se não foi coincidência. Mas foi como se fosse a primeira vez. Até que quando os cariocas chegaram em agosto, cansados da viagem de navio, deu pro leão derrota-lo por dois a um. Aí os baianos pensaram que tinham pegado “o seu” carioca. Mas logo depois o time venceu o Dois de julho (3 X 2) e arrasou seguidamente a Galícia (8 X 1) e Botafogo (5 X 0). O Ypiranga foi destacado pra segurá-lo e nada, tomou de três a dois. Finalmente, foram buscar o Bahia que lutou bravamente e conseguiu um empate em um gol. Ufa, já vai tarde!

Mas ninguém queria se conformar com a situação. Perder pro Botafogo, Fluminense e América ainda valia mas do São Cristóvão era demais. Nem dois anos se passaram e lá veio de novo o santo convidado. Foi em maio de 1935 e colocaram logo os times que estavam mais organizados para enfrenta-lo, Ypiranga e Galícia. Foi um massacre carioca, caindo o mais querido por seis a um e o antigo demolidor de campeões por cinco a um. Foi uma confusão só e ninguém mais queria jogar com o padroeiro. Mas aí entrou a Arquidiocese de Salvador. Já tinham inclusive derrubado a Igreja da Sé (merecendo passeata dos fiéis e tudo) e não se podia fazer outra desfeita à religião. Aí Bahia, Botafogo e Vitória tiveram que cumprir a sua via crucis. O tricolor caiu por dois a zero, o alvi rubro por quatro a três, e, o rubro negro, que desplante, por sete a dois. Tudo com dantes no reino de Abrantes, foi como se fosse a primeira vez.

Foi assim que o desgraçado do São Cristóvão virou pernona non grata na Bahia. Pra não chatear muito vocês nem vou contar o que aconteceu com o Bangu, o Flamengo e o Vasco da Gama nas sacanagens que fizeram com os baianos nas primeiras vezes que surgiram na Bahia.

Franklin Oliveira Jr. é desportista, escritor, professor universitário e criador do blog memorias da fonte nova.

1 comentários:

16 de agosto de 2011 às 05:19 omas disse...

Agora ficou mais fácil de entender por que o Flamengo tem a segunda maior torcida do Estado e que outros clubes do Rio têm também uma grande torcida por aqui. Isso acaba com a falácia de quem diz que os times do Rio têm torcida grande por que são apoaidos pela Globo entre outros blablabla...

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