| por Uyatã Rayra |
Ainda me lembro: faz dez meses que cheguei de supetão na casa de Enia e lá estavam, além da anfitriã, Paulão e Eder, entretidos com o projeto piloto de uma revista que nem sequer tinha nome. Convidaram-me de cara para auxiliar na construção e me explicaram bem superficialmente o que seria. Dizer que aceitei é pleonástico!Entusiasmado com a possibilidade de adentrar ao universo jornalístico, mesmo sem saber nada sobre, comecei a pedalar em retorno à minha casa, e a cada ciclo da corrente em torno da roda dental uma nova idéia surgia. Éramos um ser único, eu e a bicicleta: um gerador enérgico-imaginário-mecânico-dinâmico.
Na primeira reunião não excedíamos quatro membros, e lá estava eu – afoito, transbordante, pleno de sugestões, convicto de que poderíamos de fato lançar uma revista muito doida, recheada de inovações conceituais e estéticas. Imediatamente propus que a concepção externa da revista deveria ser semelhante a um livreto de cordel, com uma capa bem louca, ilustrada a xilogravuras, e com um cordãozinho em laço prendendo as folhas, ao invés dos grampos. Ademais, vislumbrei que a ilustração do texto que versava sobre as conseqüências da crise global sobre a Bahia deveria ser uma carranca vestida de enfermeira portando uma seringa na mão. Tal alusão imagética, para mim, denotaria um amuleto, que afugentaria os maus espíritos da crise, além da seringa fazer menção à “imunidade econômica”, excessivamente presente nos discursos do presidente Lula na época. Fui rechaçado!
Quanto à carranca, não entendo até hoje o porquê da repulsa. Porém, em relação à revista semelhante a um cordel, confesso que minha mente se embolaria num nó bem apertado se eu tivesse que enlaçar ¼ das mil revistas. Logo percebi que era necessário parcimônia; teria de conter meus ânimos e pensar de acordo com as nossas limitações – éramos virgens, praticamente. Recordo-me bem das primeiras deliberações: o projeto inicial da revista contava com o mesmo número de sessões atuais (e a não ser a sessão “Palco”, adicionada quase de última hora, as restantes não se distanciavam muito do que temos hoje). Em seguida, fixamos prazos com o intuito de captar colaboradores, para que escrevessem textos interessantes para as sessões recém-idealizadas. De todos os textos que hoje constam na edição nº 0, só detínhamos o conto “A Queda”.
Éramos pretensiosos, ambicionávamos lançar a revista em maio ou junho do ano passado, concomitante com o início do semestre. Fizemos um “corre” retado para entrevistar Rubens Pereira, pró-reitor de graduação, e apertamos nossas mentes ainda mais com a transcrição da tal entrevista, e faltava editá-la. Para nossa sorte, nossos ex-colaboradores tardaram excessivamente em entregar os textos, ou os entregaram com excesso de páginas, o que tornaria impraticável a publicação, uma vez que o número de folhas da revista era limitado.
Tanta demora me afligia; os prazos já estavam extrapolados. Adentramos ao recesso acadêmico com pouco, e retornamos com quase nada. Aspirávamos rechear a revista com desenhos e ilustrações de artistas da terra, mas estes eram “artistas” em demasia. Não conseguíamos um diagramador. Não conseguíamos nos reunir. O tempo foi passando e eu, pessimista, já estava crédulo que a revista seria sepultada. Fui beber!
No Bar Antiquário, ao som de Enia e o chorinho, encontrei-me com Eder e outros companheiros. Quando penso que não, avisto Caio Augusto. Rapidamente chamei Eder e, em cochicho, confessei-lhe:
- Eder, acho que encontrei um bom ilustrador para a revista.
Durante poucos minutos conversamos com Caio e tivemos a confirmação de que ele estaria junto à nossa equipe. Não sabíamos nós (eu e Eder) que, além de solucionarmos o quesito ilustrador, teríamos de brinde um diagramador. Nossa revista recebera um eletro-choque!
Pouco tempo depois, Eder deu-me a notícia de que João Daniel se juntaria a nós, e logo em seguida Maria Dolores garantiu-nos fotografias. Daí então a revista deslanchou. De setembro a novembro, redefinimos quase todas as sessões, e demos nome a cada uma delas. Na reta final entramos em consenso em relação ao nome da revista, e quando só nos faltava a diagramação, eis que surgiu um novo problema: Caio não poderia diagramar a revista até o dia 13 de novembro, pois estava elaborando um trabalho de conclusão do seu curso na UNEF. Caímos em desespero, o ano já estava por acabar, e não nos restava muito tempo. Além disso, estávamos descredibilizados, nossos amigos debochavam constantemente conosco.
O clima ficou tenso. Mais de uma vez ouvi membros do conselho editorial proclamarem sua saída da revista. Todavia, tivemos paciência e esperamos; afinal o que era mais um mês perante outros oito?
Dia 16 de dezembro, após tantos conflitos e armistícios, enfim: TRANSA, eis-te aí.
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