Um corpo que cai

|por Franklin Oliveira|
Um corpo que cai é um dos principais filmes de Hitchcock e é antigo pra chuchu. Já o assisti umas cinco vezes. Mas confesso que ontem, ao assistir o jogo do Vitória no Paraná, me lembrei dele, pelo menos da primeira vez que o vi, quando era adolescente nos anos 60. Naquele tempo era uma novidade o gênero suspense, e o filme passou no Cinema Popular, um dos dois que tinha aderido aos “filmes de arte”, cercado do maior frisson por ter ganhado o Oscar.

Quando vejo esses filmes de terror de hoje me dá vontade de rir. Foi com o velho Hitch que aprendi como a pessoa pode se arrepiar todo no cinema. Rapaz, logo eu que tenho problemas com altura tive que sofrer com os devaneios de John “Scottie” Ferguson (James Stewart)! Em uma das primeiras cenas o cara sobe numa cadeira e dá a impressão que está no alto de um prédio e agente sofre com a vertigem da altura.

O filme não fica nisso, a história gira em torno da esposa de um amigo (Kim Novak) a quem segue por toda a cidade de Los Angeles. Ela demonstra uma estranha atração por lugares altos e leva o detetive a enfrentar seus medos. O cara pira achando que a mulher é louca e com tendências suicidas e Hitchcock vai construindo sua trama mostrando que não é necessário matar um monte de gente pra dar susto nos espectadores. Suas cenas são meticulosamente preparadas para levar à tensão e me lembro de que saí suando do filme. Um corpo que cai chegou a ser eleito por uma revista como o melhor filme de todos os tempos.

Mas eu dizia que me lembrei do velho Hitch na tarde de ontem assistindo pela Band outro episódio de suspense, a atuação do Vitória contra o Paraná, na casa do meu vizinho Carlos Bride. Tem um filosofo que disse que a história só acontece duas vezes como farsa, e é exatamente o que aconteceu ontem quando o corpo rubro-negro caiu pelas tabelas perdendo a liderança e agora sofre também com a cruel concorrência do Goiás.

Tal como James Stewart o leão parece que também tem medo de altura. Demorou pra subir na tabela e não precisa ser detetive pra descobrir que procurava, além de subir, faturar o caneco, já que não possui título nacional. Mas ao chegar ao topo do prédio, foi um suspense desgraçado pra ficar lá em cima. Imaginem que ganhamos umas dez partidas nos últimos minutos quando parecia que a cena final do filme ia rolar, e o leão ia cair da torre do sino da igreja.

Do segundo turno não dá nem pra falar. O time mostrou que tem vertigem de lugares altos e ganhou uns quatro no Barradão fazendo a torcida passar uma tensão digna de Hitchcock com os adversários apertando até o fim, sendo risível o futebol que apresentou nas vitórias magérrimas pelo escore mínimo contra o vice - lanterna Barueri e o time da sopa de letrinhas de Natal.

Fora de casa está mais para outro filme do velho, desta vez Os pássaros onde a heroína corre e se esconde o tempo todo da revolta das aves contra o sistema dos humanos. Vejam se alguém aguenta com essa campanha. Empatou com o América de Natal (2 X 2), com o Guarany (0 X 0), e até com o lanterna Ipatinga. E, a essa altura, já perdeu duas vezes lá no Sul maravilha. Pro Avaí não dá tanto pra reclamar pois é um time duro de vencer em seus domínios. Mas perder do Paraná, tenha a santa paciência!

Afinal é um time dirigido por um cara que já foi um técnico chinfrim do leão e seu meio de campo era formado por Ricardo Conceição, Fernandinho e Lúcio Flávio, que jogaram aqui e não fizeram nada. E olhem que aqui se pagava em dia e lá eles estão há dois meses sem receber salários. Deu raiva ver Fernandinho acabar com o jogo e Lúcio Flávio dirigir as ações do time e ainda correr fagueiro como fez no cruzamento que resultou no segundo gol de Arthur! Ninguém aguenta mais a apatia de certos jogadores do leão.

Pra começar Carpegiani armou mal o time. Se o elenco está mal das pernas e com dois volantes não dá (porque não estão jogando nada mesmo) podia ter entrado com Rodrigo Mancha no lugar de Tartá mesmo, pois este afinal está sendo um peso morto em campo. Mas pior ainda foi a opção por Willie no ataque preterindo Marquinhos que parece estar se recuperando. A única coisa que acertou foi barrar Dinei que esqueceu o futebol. Mas, pra ser justo, ninguém consegue ganhar os jogos se os jogadores não ajudam. Só a dupla de zagueiros Gabriel e Victor Ramos se salvou do desastre de Curitiba onde o Paraná ganhou como quis e na hora que quis!

O jogo começou quente como os filmes de Hitchcock. Já no primeiro minuto os paranaenses perderam duas chances. Na primeira, por Gilson salvar milagrosamente (a única coisa que fez na partida) e o atacante ter demorado pra chutar, e, na segunda, por Deola ter se antecipado ao chute do cara. O suspense passou por alguns minutos dando tempo ao time pra se organizar em campo. Carlinhos chegou à frente aos 2 minutos dando um daqueles cruzamentos na mão do goleiro e Willie fez o mesmo aos cinco. Parece que não treinam mais!

Aos dez foi a vez de Pedro Ken (outro que já vem há muito tempo desaparecendo das partidas) cruzar para Elton na grande área, mas o beque não deu sopa. Logo depois foi a vez de Willie passar pro nosso centro avante que foi sarrafeado na entrada da área. Pensei, é agora Pedro Ken! Mas este bateu ao lado do goleiro que não fez grandes esforços para espalmar. Foi o único chute do leão sem dentes no primeiro tempo.

O Vitória ficou alguns minutos com mais domínio de bola, deu algumas estocadas e só. O Ceará começava a despachar o América de Natal, o jogo do Criciúma continuava no suspense e o rubro negro nada! Mas o que está ruim sempre pode piorar. A partir dos 20 o time desandou definitivamente. Será que foi quando resolveu marcar no próprio campo dando espaço pro Paraná?

Foi o maior apagão, e os adversários, com três homens de mais de 30 na meiúca, se aproveitaram pra subir toda hora municiando os atacantes. Deola tirou com o pé um lançamento, Willie perdeu uma bola besta e nosso goleiro teve que salvar de novo o lançamento, e, logo depois, os caras chegaram de novo num escanteio que o atacante cabeceou e a bola passou perto. Pra honra da firma o leão chegou ao ataque aos 23 quando Tartá se enrolou todo com a bola. Que diferença do Tartá do primeiro turno, hein!

Finalmente, aos 26, saiu o gol que já vinha amadurecendo. O cara chutou de fora da área na trave e a bola sobrou limpinha para o tal do Arthur empurrar pro fundo com o zagueiro desatento. O gol despertou momentaneamente o time de sua apatia e este subiu mas completamente desorganizado. Logo depois passaram uma bola pro Elton, mas esse nem conseguiu chutar pois não tem pé direito. Um bate e rebate na área adversária termina com o chute torto de Tartá pra longe da meta. Um saco, o cara não acerta um cruzamento! A única alegria veio nessa hora...o América Mineiro abria o placar contra o Goiás.

Mas durou pouco o entusiasmo do leão que logo voltou a jogar sua bolinha de sempre nesse segundo turno, onde só deu o ar de sua graça contra o Goiás. E aos 36 minutos, o velho Lúcio Flávio chegou à linha de fundo e botou a bola na cabeça de Arthur. Esse, mesmo cercado por três jogadores do Vitória, conseguiu cabecear pra fazer o segundo gol. Um vexame! Pro desespero de nosso James Stewart nativo, o Criciúma começou a despachar o Boa Esporte chegando à liderança do certame. O time perde o controle, Gabriel e Tartá levam cartão amarelo, mas o lateral paranaense Ângelo também. Até o fim do primeiro tempo só conseguiu fazer mais uma estocada, mas Elton não dominou a bola e o beque espanou.

No intervalo bateu o maior desespero na casa do meu vizinho. Não queríamos estar na pele do Carpé. Afinal de contas, como escolher gente pra tirar naquele verdadeiro deserto de Los Angeles? Do jeito que a coisa ia prometia ser a maior desgraceira no caminho da feira. Eu pensava que ainda bem que não estávamos em New York pra não cair de prédios mais altos.

Nosso técnico resolveu corrigir a besteira que fez quando armou o time...colocando mais um volante, o Fernando Bobo. Imaginem, tomando dois a zero e reforçando a defesa. Essa alteração, como não podia deixar de ser, deu mais estabilidade ao time do meio pra traz mas ataque que é bom necas de pitibiribas! Imaginem que nem aproveitou para explorar o lado do lateral paranaense que já tinha cartão amarelo! Mas eu desconfio que colaborasse com isso o fato deles escolherem esperar o leão em seu campo pra ir só aos contra ataques.

Pedro Ken chegou á frente aos 5 mas chutou mascado. Aos 12 começaram a funcionar as descidas do Paraná quando houve uma trapalhada total da defesa num escanteio e o cara chutou tirando casquinha da trave de Deola. O tal do Arthur quase marca o terceiro, mas limpou mal a bola e Deola salvou. Um minuto depois Elton chega, mas chuta completamente torto. O rubro negro só foi chegar de novo no seu ataque cardíaco aos 21 com Willie cabeceando longe do gol. E pronto, foi só isso! Ainda entraram Marcelo Nicácio e o menino da base na lateral mas, apesar do esforço, fizeram pouco.

Aos 26 é a vez do Paraná em novo contra ataque, pela direita, mas o cara é desarmado. E, quatro minutos depois, com a bola de pé em pé, erra o último lance, quando o atacante cabeceia por cima do gol. Mais três minutos se passaram pra Lúcio Flávio chutar forte no canto e Deola fazer uma defesa complicada colocando com a ponta dos dedos para escanteio.

A essa altura o Ceará chegava aos três e o Criciúma aos quatro. Nos últimos minutos as coisas se agitaram um pouco. Ninguém pulou da torre da igreja como no filme, mas Marcelo Nicácio perdeu uma boa chance chutando em cima do goleiro aos 44, e, dois minutos depois, o atacante do Paraná deu um belo corte em Gabriel e chutou forte fazendo o terceiro gol. Era a merecida goleada mas Elton salvou a honra da firma na saída da bola, quando o Vitória foi entrando, entrando, e a bola sobrou pro centro avante que, da entrada da área, bateu de virada pra tirar o zero do placar.

Como disse o filósofo, não deu nem pra melar os filmes de Hitch. O jogo do Vitória contra o Paraná está mais pra farsa do que outra coisa. Porque o time não é mais o mesmo do primeiro turno? O que é que aconteceu? Porque figuras importantes do elenco estão jogando um futebol apático e sofrível? O Criciúma, o Goiás, o Atlético Paranaense e o São Caetano estão mantendo o desempenho, porque só o Vitória parou no tempo? Cabe à diretoria explicar e tomar providências urgentes, antes que até o acesso nos escape pelas mãos, já que o título que é bom parece que foi pras cucuias.

Franklin Oliveira Jr. é desportista, escritor, professor universitário, e criador do blog Memórias da Fonte Nova e da WEB TV Pra que política?

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