Os limites dos macroeconomistas

|por Carlos Eduardo Drumond & Cleiton Silva|
Dentre as diversas subáreas da ciência econômica, a macroeconomia é sem dúvida aquela que mais ocupa espaço fora das universidades e centros de pesquisa. Isso acontece não porque esse ramo do saber econômico seja superior aos outros, longe disso, mas porque parte das informações fornecidas por macroeconomistas do governo ou do setor privado, além de chegar ao grande público de maneira muito rápida, tende a parecer relacionada diretamente com o cotidiano das pessoas. Inflação, taxa de juros, crescimento econômico, desemprego, poupança, investimento são apenas algumas das palavras que insistem em povoar as páginas dos jornais e os noticiários da “TV” diariamente, sobretudo em momentos de crise, nos quais a ânsia das pessoas por prever o próximo cenário se aguça.

Além disso, não é demais lembrar que em período de eleições majoritárias os temas de macroeconomia são um dos mais debatidos pela sociedade: o programa bolsa-família é uma ferramenta eficaz na diminuição das desigualdades de renda? Os benefícios do programa Minha Casa Minha vida supera os seus custos? O que dizer da reforma da previdência? E da tributária? Note que após cada ação governamental devem existir setores da sociedade que podem ganhar ou perder e, portanto, uma decisão macroeconômica é, antes de tudo, uma decisão política.  

Desta forma, a atuação dos macroeconomistas costuma ser uma das principais vias de intervenção dos governos na economia, de modo que, ao se falar em política econômica normalmente está se falando em política macroeconômica. Há várias formas dos governos fazerem política macroeconômica, cada uma delas com particularidades técnicas e teóricas que não se deseja tratar aqui, mas todas elas resguardam algo em comum. Seja aumentando os gastos, mudando os impostos, manipulando a taxa básica de juros ou mesmo fazendo complicadas operações cambiais, a justificativa governamental costuma ser a mesma, promover o bem estar social.

Mesmo havendo controvérsias, até entre os economistas, sobre o real significado da expressão “bem estar social”, seria estranho imaginar que em sociedades democráticas um governante intervenha na economia tentando tornar a vida das pessoas mais difícil. Sendo assim, quando se vê o ministro da fazenda do Brasil vindo a público anunciar medidas macroeconômicas com o objetivo de sustentar o crescimento do PIB brasileiro, a mensagem do governo é que ele deseja que pessoas não percam emprego e que aqueles que procuram um possam encontrar. De maneira semelhante, quando o presidente do banco central anuncia um aumento da tributação em determinada operação financeira, ele está querendo limitar a volatilidade da taxa de câmbio, que pode interferir nos investimentos produtivos e no próprio nível de emprego da economia.

Se a realidade fosse menos complicada do que realmente é a conclusão que se poderia chegar seria a seguinte: sob a correta atuação dos macroeconomistas, estaria garantido um mundo mais estável e com as pessoas vivendo melhor. Não é essa, contudo, a mensagem deste breve texto. Certamente as políticas macroeconômicas possuem um impacto significativo no cotidiano das pessoas, mas, estão longe de ser a única chave do desenvolvimento de um país. Mesmo as políticas macroeconômicas mais bem intencionadas têm poder de atuação limitado, inclusive no tempo, não apenas porque é impossível manipular com precisão cirúrgica o PIB ou a taxa de desemprego, mas, sobretudo, porque as variáveis macroeconômicas são apenas parte da complexa dinâmica social.

O desenvolvimento de um país depende de muitas escolhas que não podem ser manipuladas pelos macroeconomistas. As escolhas políticas, a formatação das instituições, o desenho social e ideológico ou os valores morais são coisas que dependem da dinâmica interna das sociedades e ao mesmo tempo podem tornar a vida das pessoas mais fácil ou mais difícil. Até o saber instrumental dos macroeconomistas, independentemente da sua filiação teórica, tem limites visíveis, posto que variáveis como o PIB, o PIB per capita e a taxa de desemprego, por exemplo, não conseguem expressar sozinhas se as pessoas estão vivendo melhor ou pior.

O leitor que esperou até aqui pode estar confuso entre duas opções sobre o que fazer do ponto de vista prático: i) Delegar aos macroeconomistas a tarefa de desenhar os rumos do país e ir dormir em paz ii) Demitir todos os macroeconomistas do governo, já que nem eles nem a macroeconomia serve para muita coisa. De fato nenhuma dessas opções é uma opção razoável e a principal conclusão que se espera transmitir neste texto não se encontra nesses extremos. Se, por um lado, a atuação dos macroeconomistas é muito limitada, a completa ausência de conhecimentos da disciplina macroeconomia poderia ser muito danosa para a sociedade. Mesmo mirando variáveis imperfeitas como o PIB per capita, a atuação adequada dos macroeconomistas pode ser útil para evitar a perda de empregos e de oportunidades, porém, é importante ressalvar, a macroeconomia é apenas parte do todo e sozinha não é a chave do desenvolvimento.

Carlos Eduardo Drumond é Professor do DCEC-UESC, mestre e doutorando em desenvolvimento Econômico – PPGDE-UFPR 
Cleiton Silva é Professor do DCIS-UEFS, mestre e doutorando em desenvolvimento Econômico – PPGDE-UFPR

2 comentários:

10 de julho de 2012 às 13:40 Dyeggo Guedes disse...

Como indaga e diz o mestre Cleiton em sala de aula: "o que os médicos sabem sobre o câncer? R. muita coisa; e o que não sabem? R. muita coisa ainda." A analogia cabe para os macroeconomistas, no entanto e, num olhar demasiadamente "pretencioso" para um estudante de economia, creio que caberia salientar na análise acima o caráter conflitivo que envolvem as decisões macroeconômicas. Não que o texto tenha esquecido de colocar o lado ideológico do debate, explícito suscintamente quando das controvérsias sobre o entendimento de "bem-estar" entre os macroeconomistas. Porém,as decisões que cabem dentro desta sub-área da economia são extremamente relegadas ou cerceadas quando em prol da maioria populacional (redistribuição de terras - reforma agrária, reforma tributária, previdenciária, enfim...).
Lógico, não podemos comprometer o todo (neste caso, os macroeconomistas) por conta de alguns (infelizmente e neste caso, a grande maioria), mas acho que poderia ser salientado pelo texto, politizaria mais o debate que envolve diretamente as decisões de política econômica (ao meu ver) - ... no entanto, posso estar equivocado (como diria mais uma vez um dos autores do texto).
Só gostaria de destacar que o texto é bem esclarecedor e uma chave para descortinar um pouco daquilo que está por trás do debate político-econômico.

11 de julho de 2012 às 10:30 Unknown disse...

Caro Dyeggo,
Suas colocações são pertinentes, elegantes e inteligentíssimas. Certamente é fruto de reflexões profundas acerca da complexa dinâmica social. As perguntas que vc faz tb são excelentes, e cada pergunta é munição para uma linha de investigação. Como diria meu maior Mestre: "una pregunta un artículo".

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