Copa América: o reino das zebras ou a concretização de catching up?

|por Giliad de Souza|
Essa Copa América tem sido um chamariz de [boas] surpresas para o futebol da América do Sul. A quebra do binômio oligopólico futebolêsco Brasil-Argentina, o surgimento de novas sensações e ídolos sulamericanos e, em especial, o concreto movimento de países sem tanta tradição internacional em alcançar (catch up) os níveis futebolísticos de seleções renomadas são alguns exemplos de boas surpresas.

Antes de qualquer coisa, o que significa o termo “catching up”? Este diz respeito ao processo de desenvolvimento tecnológico, produtivo e mitigação de níveis gritantes de concentração de renda executado intencionalmente em países ou região de países visando alcançar (catch up) níveis de índices econômicos que seriam entendidos enquanto referência. Os estudos que tinham esse movimento enquanto objeto, assim como a aplicação e formulação do termo direcionam-se, sobretudo ao boom de desenvolvimento do sudeste da Ásia (Coréia do Sul, Taiwan, Cingapura e Hong Kong), os chamados Tigres Asiáticos, na década de 1970, que crescia mais e com maior qualidade do que o resto do mundo. Nesta época a taxa de crescimento do PIB dos Tigres era muito maior que, por exemplo, a do “milagre” brasileiro, foi constituído um Sistema Nacional de Inovação, assim como superado diversas anomalias sistêmicas, como o analfabetismo e a mortalidade infantil, enfim, fora aplicado uma estratégia nacional de desenvolvimento bem-sucedida. Isto é um exemplo clássico de catching up. Outro termo utilizado para a análise da trajetória histórica de desenvolvimentos dos países é o “fall behind”, ou seja, quando um país não só perde o ritmo de desenvolvimento, como ainda “anda pra trás”. O caso clássico poderia ser a própria Inglaterra, que, de Império, no mínimo, do século XVII ao XIX, uma potência industrial, financeira e militar, a unicamente uma referência financeira e turística, perdendo para os EUA, num determinando momento histórico para a Alemanha e URSS, e atualmente para a China.

Pois bem, após a definição do termo, o questionamento aqui feito é: essa Copa América foi (e está sendo) um verdadeiro passeio das zebras e bruxas ou é de fato a concretização de um catching up no futebol sulamericano? Como já fora mostrado neste mesmo veículo de comunicação, países como Uruguai, Chile, Paraguai, Colômbia e Venezuela podem ser considerados qualquer coisa, menos zebra. Vejamos: o Uruguai, que já foi uma das maiores potências no futebol mundial, sofreu um movimento de fall behind, mas já há tempos está num movimento de catching up, vide o ótimo resultado na Copa do Mundo de 2010 e tendo o seu atacante como o craque e um dos artilheiros da Copa – Diego Forlán; o Paraguai, que durante quase toda a integralidade das Eliminatórias para a Copa de 2010 reinou em primeiro, classificou-se em terceiro, à frente da Argentina, passou para a segunda fase da Copa, ficando em primeiro do seu grupo, desbancando a então campeã do mundo – Itália, e só perdendo, nas quartas para a campeã e indiscutível melhor seleção do momento – Espanha; Chile, que nas últimas Eliminatórias ganhou tanto do Brasil quanto da Argentina, ficando em segundo a um ponto do primeiro colocado – Brasil, classificou-se para a segunda fase da Copa de 2010 em segundo colocado, empatando em pontos, porém perdendo em saldo de gols para o primeiro colocado – Espanha e perdendo nas oitavas para o Brasil; Colômbia, que vem passando por um forte processo de reformulação na equipe, ganhou a primeira Copa América desse século e milênio, porém ficando fora da última Copa por apenas 1 ponto. Ela tem se mostrado um verdadeiro baluarte tático; Venezuela, que desde a última década tem se esforçado pra superar o estigma de “saco de pancada”, tem obtido sucesso nesta empreitada, vide alguns resultados expoentes, como a goleada de 3x0 contra os EUA, lá em terras ianques.

O argumento sustentado aqui é que esse novo ambiente futebolístico sulamericano, no qual o binômio oligopólico futebolêsco Brasil-Argentina não mais expressa uma hegemonia plena, assim como os ótimos de seleções menos expressivas não é desdobramento de algo fortuito ou “sorte”, porém, pelo contrário, é resultado de diversos movimentos de catching up, intencionalmente planejados e executados. Não é em vão que os times dos países supracitados se apresentam como adversários de alto nível, diversos de seus jogadores atuantes nos times mais ricos do mundo e suas ligas nacionais com um nível de profissionalização bastante elevado. Tudo isto é fruto de uma estratégia de desenvolvimento para o setor do futebol, estratégia bem-sucedida de catching up. O que não significa necessariamente um movimento de fall behind do binômio oligopólico futebolêsco, no entanto isto implica que aqueles países sem tanta tradição ou inserção internacional têm intentado alcançar (catch up) os níveis futebolísticos de seleções renomadas, como as próprias Brasil e Argentina.

Giliad de Souza é Economista pela UEFS, mestrando em Economia pela UFRGS e Rubro Negro de Coração.

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