Tropa de Elite 2: o inimigo agora é outro

|por Cléo Emidio*|

Com um mês do seu lançamento Tropa de Elite 2 já ultrapassou os 8 milhões de espectadores nos cinemas, isso sem contar os pirataitions, ou seja, muita gente já assistiu, o que significa que já deve estar na casa das dezenas de milhões de pessoas que assistiram a essa película nacional, soma-se a isso seu sucesso de bilheteria, com salas lotadas até hoje. Foi também minha experiência ao pegar aquele cineminha que rola de vez em quando, sabe como é! Na verdade uma boa produção, ou como seria um filme de impacto do cenário Hollywoodiano, uma super-produção, só que a moda brasileira. De certa forma, essa idéia também sustentada em parte pelo autor desta resenha, articula essa produção dentro do campo da cadeia cinematográfica brasileira que ampliou sua produção e diversificou suas perspectivas de abordagem, enredo e roteiro.

O diretor, José Padilha, tem uma filmografia enamorada com um discurso social ainda meio difuso e inconsistente, talvez em formação. Seus filmes principais corroboram para a politização de temas polêmicos ou caidos no tratamento obscurantista, a exemplo da temática da corrupção e da violência retratados no Tropa de Elite 2. A este se soma o Tropa de Elite 1; Garrapa, filme documentário sobre a Fome, traz a situação do Nordeste do Brasil; e Ônibus 174, sobre o sequestro do ônibus 174 em 12 de junho de 2000 na zona sul do Rio, episódio que teve como “algoz” um sobrevivente da chacina da Candelária.

De roteiros sem muita sinuosidade, meio que até previsiveis em certo sentido, o diretor mantém esse perfil, mas faz a opção por um ritmo diferente nesta 2 edição do Tropa de Elite. Menos intenso que a 1° edição do filme, talvez pelo menor uso de cenas de violência e tortura explicita que não deixam de ter o seu lugar no Tropa 2, explora mais “os diálogos” como outros campos de sentidos, como a família que ganha maior ênfase e também o seu desenlace amoroso que toma conotações outras (na oportunidade a ex-mulher do Capitão Nascimento agora convive com um opositor da política do mesmo).   

A primeira produção do Tropa de Elite trouxe consigo muita polêmica ao expor o modus operandi do Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar do Rio de Janeiro (Bope). O filme se desdobra em constantes cenas de ação nas favelas do Rio, num ritmo intenso e por que não frenético ao embalo de sua trilha sonora. O central é a atuação da polícia do Rio de Janeiro no combate ao tráfico a partir das ações do Bope, o excessivo “instinto” de violência que marca a atuação e a formação desse Batalhão e o uso da tortura como um dos principais instrumentos de trabalho. A principal função do Bope é matar, a exemplo do que simboliza a caveira na farda do Batalhão e o uso do chamado Caveirão (carro blindado utilizado nas “invasões bárbaras”).

No segundo filme o diretor continua a “saga” do Capitão Nascimento e seu esforço para estabelecer a segurança dos citadinos da cidade maravilhosa. Continua no centro a figura do Capitão Nascimento, agora Coronel, com interpretação do ator Wagner Moura, só que agora ele atua na Secretaria de Segurança Pública do Estado. Seu principal confronto é contra seus próprios pares, a polícia corrupta e seus genéricos os milicianos, que tem como parceiros de primeiro plano forças políticas e políticos que ocupam espaço no Estado. De ser seu confrontante o agora parceiro de sua (ex)mulher, personagem ativista dos direitos humanos e parlamentar(1), torna-se seu potencial e principal aliado.

O esquema é grande. Vai desde a Assembleia Legislativa, passando pelo Palácio da Guanabara, envolvendo empresários e comunicadores sociais em geral e chegando aos morros e favelas cariocas, só para citar alguns atores. É por ai que vai se produzir e reproduzir a política de segurança do Rio, só que antes desta vem a política da insegurança. Este forte esquema aliado a imprensa (no filme tem um apresentador alá Varela que apresenta um programa tipo o na Mira aqui da BA) promovem verdadeiro espetáculo de pânico e medo, com denúncias sensacionalistas de problemas sociais. Daí fica fácil, é só pedir porrada no lombo dos bandidos que o Governo responde e no final o povo aplaude.

 Referência ao Ficha Limpa.
Talvez o grande mérito do filme seja expor de onde se “origina” a corrupção. Este tema tratado de maneira tão estapafúrdia como visto na última eleição presidencial, no filme perde seu caráter moralista. O filme vai encaixando e desencaixando percepções que temos sobre o tema, mesmo que para alguns tudo o que foi mostrado não seja novidade. No entanto, lembremos que o predominante dos debates sobre o tema da corrupção é pautado pela grande mídia e pelos interesses elitistas que difundem um senso comum muito pernicioso e que no final diz que política e político é tudo igual. Ou seja, “basta ficar sentado no apartamento com a boca escancarada cheia de dentes esperando a morte chegar...” Ou em outra linguagem, esse senso comum é um grande golpe na esperança das pessoas na possíbilidade de tranfrormar suas realidades. E isso passa na Globo!

Enquanto instrumento que provoca um campo de politização quanto a temas tratados e determinados pelas visões do senso comum, como a violência e a corrupção, o filme expõe a nú os entrelaços que garantem o estado de terror e a dominação política e econômica no Rio de Janeiro. Mostra que os de baixo nada mais são do que vítimas de uma assenhorada manipulação de orgãos, instituições e espaços de poder na sociedade.

Esperar pelo terceiro filme não será nada de espantoso, afinal ficou a deixa. Se o diretor vai aprofundar a abordagem que desenvolveu no Tropa 2, o que já seria interessante, não se sabe. Qual o futuro do Coronel Nascimento, não se sabe. Mas ele pode também inventar algum desfecho com herói redentor ou apaixonado melodramático que certamente surpreenderia. Aguardemos!

(1) No Filme o personagem do parlamentar Fraga é “inspirado” na atuação do deputado estadual Marcelo Freixo|PSOL-RJ.
*Pedagogo pela UEFS e militante socialista

2 comentários:

17 de novembro de 2010 às 08:23 Deusdete disse...

fui um desses milhoes de espectadores piratations devido a impossibilidade de ir ao shopping (rsrs)... mas mesmo assim acho que foi possível ter dimensão da imagem retratada nessa segunda versão do tropa de elite. isso porque o diretor ,josé padilha, preocupou-se em exclarecer bem mais explicitamente qual a imagem a ser retratado no tropa de elite.com isso, acredito tbm que foi possível a partir do tropa de elite 2, dar um significado a mais no filme 1 mostrando que a ideia do tropa de elite não foi apenas mostrar as megas preparações e operações do Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar do Rio de Janeiro (Bope) como se isso fosse lindo :), mas sim retrarar o dia-dia da comunidade das favelas do rio de janeiro ligado a toda problematica da exclusão social, mostrando que megas operações não resolverão seu problema.

27 de novembro de 2010 às 14:59 Cléo Emidio disse...

A guerra começou! Da para assistir de "camarote" o conflito no RJ. Novamente é protagonista o BOPE só que agora conta com o apoio de parte das forças armadas. Quem assisti TV percebe que aquilo ali é um cenário de guerra. E tem ainda a mídia que faz um verdadeiro espetaculo, um show. Uma coisa "nova" seria o suposto apoio da população as operações e ações do governo do Estado do Rio. Antes poderiamos dizer que eles se posicionavam mais do lado do trafico, hoje pareçe que isso se inverteu, pelo menos em parte. Pq será?

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